31.7.14

Roçando

Ainda que vermelhos flutuantes
Guardo-te entre a maré e a queda.
Fluxo dos olhos meus
para os miúdos olhos teus...

No caótico corpo carnoso.
No beijo cor de rosa. 
Nas flores sofridas de apartamento.
No canto lutuoso de um azulão.

Escodo-me nos restinhos de gosto bom.
No cheiro de Jaboticaba. 
Nas cores de nossa bandeira.
Entre as cordas do teu violão. 

26.7.14

Dorido, dolorido, colorido...

Lanço-me no emaranhado de tuas fracas vontades. 
Contra-fluxo de sentimento dorido.
Prove do gosto de meu amor carnoso.
Vá roendo os ossos,
Bebendo o sangue,
Chupando o tutano...
O amor aqui é comestível.
Mutável.
Humano...

24.7.14

Cotidiano contido

     Nunca neguei meu gosto por delicadeza; um sopro de vento, um banho de mar, uma oferenda de rosa e perfume, beijos no beco e assim vai... Como de costume levantei cedo, joguei água gelada na vista torcida, tropecei na mesinha da sala, acendi um cigarro na boca do fogão, voltei para o meu quarto, abri a janela e fiquei por ali; reparando o vento e o leriado das crianças da vizinha. numa desas de reparar a bendita da vizinha sai e grita:
-Bom dia seu Pedro.
    Ainda tropo das pernas e da vida, quase não respondi a senhora de ancas largas e sorriso claro...
-Bom dia dona Marta, como vai a senhora?
-Vou vivendo, sabe como é; o Marquinhos operou da fimose faz dois dias e já quer sair para jogar bola, vê se pode seu Pedro, o menino mal sarou e já quer virar bicho?
    Por quê diabos eu fui perguntar se ela está bem, eu costumo cagar para os vizinhos e para o mundo, tenho que parar de ser falso.
-Deixa o menino dona Marta, cada um sabe onde dói.
-Mas seu pedro, o senhor já operou da fimose? é muito feio, é de fazer dó.
-Se operei não me lembro, mas acho que nunca tive problemas, vou voltar para a cozinha porquê deixei o fogo ligado, mas depois continuamos a falar da fimose de seu filho.
-Vai lá seu Pedro, fogo ligado é um perigo.
     Finalmente a gralha calou a boca, não me importo com barulho, me importo mesmo é quanto o barulho resolve me dizer bom dia, eu lá tenho cara de quem gosta de ser amigável? Só queria fumar meu cigarro, olhar os pombos e reparar nos moleques, sei lá; gosto de ver criança, não por gostar de crianças, até porquê, mal falo com os meus sobrinhos, muito menos com os filhos dos outros, o negocio é que fico do quinto andar vendo tudo, me sentindo um deus pagão, desinformado e mal amado, olhando para o tempo que passou sambando na minha cara. Cara que hoje é amarrada, que vive de fumo, musica e pelos...
     Voltei para cozinha, sentei-me na velha cadeira de madeira e pensei um instante a quão saborosa a tal da Dona Marta é... Deve ser a única explicação plausível para que tenha tantos filhos, já que quando abre à maldita boca, toda sua beleza se vai a cada respingo de saliva, onde suas palavras são extremamente descartáveis. Pois bem, me deparo com um troço duro logo a minha frente. Voltei para a janela.
Ao passar dos anos não ligamos tanto para o conteúdo, quando se percebe que está ficando velho e sozinho, a única coisa que se deseja é ter com quem foder só para garantir que ainda está vivo. Não me importo, não tenho mais nada a perder, o que eu tive de melhor foi perdido nas entrelinhas da vida:
-Dona Marta, poderia subir até o meu andar? Preciso trocar umas palavras com a senhorita.
- Tudo bem seu Pedro, só espere um momento!
    Lá vem ela, toda desengonçada de tanto rebolar as cadeiras, solta os bobes do cabelo enquanto eu a vejo pelo olho mágico do outro lado da porta.
- O que deseja seu Pedro? Está precisando de alguma coisa?
     Pensei uma vez e agi duas. Sem trocar uma palavra a virei e a beijei intensamente, deixando minha barba deslizar por seu pescoço, acariciando cada parte de seu corpo e ela sem interrogar, entrou na minha dança com corda bamba. Durou menos de 15 minutos, não consegui me segurar por muito tempo, não estava nem um pouco preocupado com a satisfação dela, só queria me garantir e isso foi o suficiente, logo a mandei embora, não queria ouvir a gralha novamente, afinal, não queria estragar meu momento “êxtase” .
    As puras moças que não se aproximem; ogro ou santo, meu nome vai acabar no mesmo lugar, numa lápide cinza, com a minha irmã chorando e me chamando de anjinho. Por agora vai rodar nas bocas das pulhas: “Homens são todos iguais!” É complicado não pensar no próprio pau quando a parceira de ocasião está te avaliando para contar para as amigas. Para a grande maioria das mulheres sexo é só abrir as pernas e levantar a bunda, Mas qualquer pessoa certa da cabeça sabe que sexo pode ir além da carne e muito além da garganta, não estou falando de encontrar o tal ponto G, estou falando de saber ser mais que um pedaço de carne viva e vermelha, ir além dos desamores passados e procurar um acaso e não mais um para lista de bons meninos.

(De Bia Quadrelli e Leticia Borges)

23.7.14

Pedaços

Rasgando meu peito ancho.
Reviro-me entre cores e destroços passados.
Venha cá;
Dê-me um beijo.
Olhe no fundo da moringa de barro.
Aproveite os meus versos livres
no recheio dos teus poemas abstratos.
Para quem sabe rodar com o vento leve.
Arrastar o tempo nos pelos.
E piar com sangue na língua.

22.7.14

Café com leite

Lambendo os lábios leitosos
Para pingar no café amargo
O branco que ainda temos de vida...

14.7.14

Átimos

Não meu amor,
Não sou a hipócrita
Que te promete uma vida de riso.
Sou de sonho e sangue.
Não prometo-te nada além de meus punhos de carne 
e desajustados desejos.

Amo-te com poros e nervos;
Não vou te privar da dor, da felicidade,
Da angustia encavalada,
Do canto dos passarinhos,
Da viola dos amadores
E nem dos carinhos de outras tantas.

Quero que beba de todas as fontes,
Prove do mel e do fel.
Sinta entre as narinas o cheiro da imensidão.
Para quem sabe um dia intitular-se feliz, 
Não na vida,
Mas no momento...

10.7.14

Sagrada

Nas curvas de minhas tantas vontades,
Perco-me nos reflexos de meus olhos.
Reparo de dentro para fora.
Sinto o cheiro da terra. 
Me apego aos meus orixás.

Danço em todos os cantos.
Vou desatinando, 
Desviando nas bocas.
Fazendo fumaça.
Cantando pra Exú.

Me espalho no catimbó.
Suspiro nas Juremas.
Vou de costas.
Confio no meu querer.
No meu passo viciado
Que uma vez por ano me mata na avenida. 

5.7.14

Aquele que vive

Nos teus versos tropos.
Nas tuas rugas encolhidas.
Nos teus tolos lamentos.
É aí que estou,
nesta tua baderna que me desloca,
me enrosca.

Não me fale de poesia.
Hoje só quero o poeta.
Que quando bruto,
enverga este meu intitulado desmundo.

Brinque nos destroços de meu atual ideal.
Deus dorme.
Quem vive é tu.